As infeções associadas aos cuidados de saúde representam uma grave ameaça à saúde pública, sendo adquiridas durante tratamentos médicos ou internamentos hospitalares, resultando frequentemente em hospitalizações prolongadas, custos elevados para os sistemas de saúde e elevadas taxas de mortalidade. Portugal apresenta uma das taxas mais elevadas de infeções associadas aos cuidados de saúde na Europa, agravadas pelo aumento preocupante da resistência a antibióticos de última linha. Estes antibióticos são a última alternativa terapêutica contra infeções por bactérias multirresistentes, utilizados quando outros antibióticos não são eficazes. As bactérias do género Klebsiella são uma das principais causadoras destas infeções, sendo geralmente tratadas com antibióticos da classe dos carbapenemos. No entanto, bactérias produtoras de carbapenemases — enzimas que degradam estes antibióticos — são cada vez mais comuns, tornando o tratamento cada vez menos eficaz.

Início / Publicações / Publicação

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DNA e Bactérias

Tipo de publicação: Resumo do Artigo
Título original: The role of mobile genetic elements in the dissemination of resistance genes in Klebsiella spp. clinical strains
Data da publicação do artigo: Novembro de 2023
Fonte: Repositório Institucional do Instituto Superior Técnico (Scholar)
Autor: João Francisco Ramalho
Orientadoras: Cátia Caneiras & Leonilde Moreira

Qual é o objetivo, público-alvo e áreas da saúde digital em que se enquadra?
     Este estudo tem como objetivo analisar o panorama da resistência a uma classe de antibióticos, chamada carbapenemos, em espécies de Klebsiella presentes em hospitais portugueses. O público-alvo inclui microbiologistas, infecciologistas, epidemiologistas, administradores hospitalares responsáveis por estratégias de prevenção e empresas farmacêuticas envolvidas no desenvolvimento de antibióticos. No contexto da saúde digital, o estudo contribui para a vigilância epidemiológica ao utilizar ferramentas de bioinformática e sequenciação total do genoma para identificar genes de resistência.

Qual é o contexto?
     As infeções associadas aos cuidados de saúde representam uma grave ameaça à saúde pública, sendo adquiridas durante tratamentos médicos ou internamentos hospitalares, resultando frequentemente em hospitalizações prolongadas, custos elevados para os sistemas de saúde e elevadas taxas de mortalidade. Portugal apresenta uma das taxas mais elevadas de infeções associadas aos cuidados de saúde na Europa, agravadas pelo aumento preocupante da resistência a antibióticos de última linha. Estes antibióticos são a última alternativa terapêutica contra infeções por bactérias multirresistentes, utilizados quando outros antibióticos não são eficazes. As bactérias do género Klebsiella são uma das principais causadoras destas infeções, sendo geralmente tratadas com antibióticos da classe dos carbapenemos. No entanto, bactérias produtoras de carbapenemases — enzimas que degradam estes antibióticos — são cada vez mais comuns, tornando o tratamento cada vez menos eficaz.

     Os genes que codificam carbapenemases estão maioritariamente localizados em plasmídeos — pequenas moléculas circulares de ADN independentes do cromossoma bacteriano. Estes plasmídeos desempenham um papel crucial na resistência antimicrobiana, uma vez que podem replicar-se independentemente e transportar múltiplos genes de resistência, permitindo que as bactérias se adaptem rapidamente aos antibióticos. Além disso, facilitam a transferência horizontal de genes, promovendo que a resistência se espalhe entre diferentes ambientes e hospedeiros, incluindo humanos e animais. Um exemplo disso ocorre quando bactérias resistentes a antibióticos estão presentes na carne destinada ao consumo humano. Após a ingestão, essas bactérias podem multiplicar-se no intestino e transferir os seus genes de resistência para bactérias que já lá existem.

Quais são as abordagens atuais?
     Atualmente, a identificação de bactérias resistentes a antibióticos baseia-se numa combinação de técnicas laboratoriais e ferramentas de bioinformática.

     Os métodos laboratoriais tradicionais incluem testes de suscetibilidade, como a técnica de difusão em disco de Kirby-Bauer, na qual um disco impregnado com antibiótico é colocado numa cultura bacteriana. Após a incubação, a presença de uma zona clara ao redor do disco indica suscetibilidade, enquanto a sua ausência sugere resistência. Para uma quantificação mais precisa, o teste Epsilometer (ETEST) determina a concentração mínima inibitória — a menor dose de antibiótico necessária para inibir o crescimento bacteriano — ajudando na escolha da dosagem adequada e na avaliação da resistência a antibióticos de última linha.

     A amplificação por Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) é amplamente utilizada para detetar genes de resistência específicos. Nesta técnica, os investigadores selecionam um gene alvo e desenham primers — sequências curtas de ADN —que definem os pontos onde a amplificação deve começar e terminar. No entanto, a PCR apenas identifica genes previamente conhecidos, limitando a deteção de novas mutações que conferem resistência. Para superar esta limitação, pode ser usada a sequenciação total do genoma que analisa todo o material genético bacteriano, incluindo cromossomas, plasmídeos e outros elementos genéticos. O ADN é fragmentado, sequenciado e, em seguida, reconstruído usando ferramentas de bioinformática, fornecendo informações detalhadas sobre genes de resistência, mutações e variações genéticas que impulsionam a resistência a antibióticos.

     Estas técnicas são ainda complementadas por ferramentas de bioinformática como o BLAST (Basic Local Alignment Search Tool), que compara  sequências genéticas lineares com uma base de dados para identificar genes de resistência conhecidos. O BLAST ring image generator, por outro lado, fornece um mapa circular que compara visualmente um genoma de referência com vários genomas bacterianos ao mesmo tempo, destacando regiões genéticas conservadas e genes de resistência únicos.

Em que consiste a inovação? Como é que é avaliado o impacto deste estudo?
     Este é o primeiro estudo genómico em larga escala de espécies de Klebsiella em hospitais portugueses, que combina análises genéticas, microbiológicas e bioinformáticas avançadas para descobrir mecanismos de resistência aos antibióticos e de transmissão bacteriana. Uma inovação fundamental foi a descoberta de um novo gene de Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC), o gene blaKPC-98, que compromete a eficácia do antibiótico de última linha ceftazidima-avibactam. Apresentado pelo grupo laboratorial, este gene foi reconhecido como uma nova variante no GenBank.

     Para contextualizar as descobertas portuguesas a nível global, o estudo utilizou o GenBank, para identificar genes de carbapenemases e estirpes comuns de Klebsiella a nível mundial.

     O estudo analisou 1.140 amostras clínicas de Klebsiella recolhidas entre 2019 e 2022 em três centros hospitalares portugueses. A multirresistência a antibióticos (resistência a três ou mais classes de antibióticos) foi avaliada pelo método de difusão em disco de Kirby-Bauer contra seis classes de antibióticos. Em seguida, as amostras foram submetidas à análise por PCR e analisadas por BLAST para identificação das estirpes Klebsiella e dos principais genes de carbapenemases (blaKPC, blaOXA-48, blaVIM, blaNDM, blaIMP, blaGES). A partir destas, um conjunto diversificado de 218 amostras foram escolhidas para serem submetidas à sequenciação total do genoma e os plasmídeos obtidos foram alinhados usando o BLAST ring image generator.

     A análise bioinformática incluiu o uso da ferramenta Kleborate para identificar amostras de Klebsiella de alto risco associadas a surtos hospitalares, com base em três fatores genéticos: (1) linhagem de alto risco definida por mutações em genes housekeeping (essenciais para a sobrevivência), que geralmente são conservados, mas que, quando alterados, podem adquirir mutações que marcam novas linhagens e permitem a monitorização da transmissão, pois estas mutações raramente são perdidas; (2) presença de genes de multirresistência e (3) genes específicos K-locus e O-locus, que codificam moléculas à base de açúcares de superfície,  ajudando as bactérias a escapar à deteção pelo sistema imunitário do hospedeiro.

     Para caracterizar o gene blaKPC-98, o estudo integrou análises genómicas, microbiológicas e bioinformáticas, comparando-o com genes blaKPC semelhantes para confirmar sua descoberta. A clonagem genética foi realizada para gerar grandes quantidades de bactérias portadoras de blaKPC-98, sendo depois submetidas a testes de suscetibilidade (Kirby-Bauer e ETEST) para verificar a resistência à ceftazidima-avibactam. Além disso, o estudo também avaliou o custo de fitness, ou seja, o impacto do gene na sobrevivência bacteriana. Para avaliar isso, foi comparado o gene blaKPC-98 com o gene blaKPC-3 através de um ensaio de crescimento bacteriano a longo prazo, cultivando as bactérias durante 240 horas sem antibióticos. O objetivo foi determinar se o novo gene de resistência seria perdido ao longo do tempo devido ao gasto de energia e recursos necessários para produzir a proteína de resistência. No final da experiência, as bactérias portadoras de blaKPC-98 foram novamente testadas utilizando o método de de Kirby-Bauer para avaliar se mantinham a resistência à ceftazidima-avibactam.

Quais são os principais resultados? Quais são as principais conclusões?
     A nível mundial e em Portugal, a Klebsiella pneumoniae é a espécie predominante dentro do género Klebsiella (>93%). Em Portugal, a Klebsiella aerogenes é mais comum do que a Klebsiella quasipneumoniae, enquanto globalmente a tendência se inverte. A distribuição dos genes de carbapenemase varia regionalmente: os genes blaNDM-like dominam na Ásia, blaKPC-3 e blaOXA-48 na Europa e blaKPC-2 na América. Em Portugal, o blaKPC-3 é o mais prevalente, seguido do blaOXA-181 e do blaNDM-1. Apenas 20% das amostras não apresentavam genes de carbapenemase, e várias continham múltiplos genes de carbapenemase, reforçando a preocupação com a disseminação da resistência. Os resultados da PCR e da sequenciação total do genoma foram concordantes, confirmando a robustez da análise.

     A maioria dos plasmídeos produtores de KPC eram grandes, transportavam múltiplos genes de resistência e foram identificados em várias espécies de Klebsiella, sugerindo um mecanismo altamente conservado de transferência horizontal de genes. Da mesma forma, plasmídeos produtores de OXA-181 também foram detetados em diferentes espécies de Klebsiella, demonstrando o potencial de disseminação destes elementos genéticos.

     Todas as amostras com o gene blaNDM-1 possuíam o mesmo plasmídeo (pNDM1_FMUL424), pertenciam à mesma estirpe de Klebsiella pneumoniae (ST11-KL105-O2) e eram originárias do mesmo hospital (Hospital 3), confirmando um surto hospitalar com possível transmissão entre pacientes. Em contraste, o Hospital 1 apresentou outras linhagens dominantes de Klebsiella pneumoniae: ST17-KL25-O5, ST147-KL64-O2, ST13-KL3-O1, ST13-KL19-O1 e ST307-KL102-O2, enquanto o Hospital 2 foi afetado principalmente por ST17-KL25-O5 e ST13-KL3-O1. As linhagens ST17-KL25-O5 e ST147-KL64-O2 estão globalmente difundidas desde meados da década de 1980, enquanto as estirpes ST13 parecem ser exclusivas dos hospitais portugueses. Um surto alemão foi associado ao ST307-KL102-O2, destacando o seu potencial de disseminação internacional.

     O estudo constatou que 98,9% das amostras eram multirresistentes, apresentando elevadas taxas de resistência a penicilinas (99,1%), carbapenemos (90%-97,4%) e cefalosporinas (85,2%-96,5%). No entanto, a ceftazidima-avibactam manteve-se eficaz na maioria dos casos, com uma taxa de resistência relativamente baixa de 8,6%. Este perfil de resistência reforça a urgência da monitorização contínua de mecanismos de resistência emergentes, como o recém-descoberto gene blaKPC-98, identificado na linhagem ST13-KL19-O1 de Klebsiella pneumoniae. Este gene foi comprovadamente capaz de comprometer a eficácia da ceftazidima-avibactam. No entanto, o gene blaKPC-98 impôs um elevado custo de fitness, levando à sua perda após 240 horas sem exposição ao antibiótico. Em contraste, o gene blaKPC-3 com um menor custo de fitness, permaneceu presente. A tendência das bactérias de perderem plasmídeos não essenciais ao longo de gerações permite-lhes otimizar a sua sobrevivência, mas sob pressão antibiótica sustentada, os plasmídeos portadores de múltiplos genes de resistência proliferam de forma mais eficiente, impulsionando a resistência antimicrobiana nos hospitais.

     Para combater a Klebsiella resistente a carbapenemos em ambiente hospitalar, é essencial uma vigilância epidemiológica reforçada, adotar medidas rigorosas de controlo de infeções e promover a colaboração internacional através da partilha de dados e boas práticas. Os programas de gestão de antibióticos devem promover o uso responsável de antibióticos, reduzindo a pressão seletiva e preservando as opções terapêuticas de última linha. Pesquisas futuras devem incluir a análise de amostras ambientais, como superfícies hospitalares e fontes de água, para mapear vias de transmissão e compreender melhor os mecanismos de resistência.

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Tipo de publicação: Resumo do Artigo
Título original: The role of mobile genetic elements in the dissemination of resistance genes in Klebsiella spp. clinical strains
Data da publicação do artigo: Novembro de 2023
Fonte: Repositório Institucional do Instituto Superior Técnico (Scholar)
Autor: João Francisco Ramalho
Orientadoras: Cátia Caneiras & Leonilde Moreira

Qual é o objetivo, público-alvo e áreas da saúde digital em que se enquadra?
     Este estudo tem como objetivo analisar o panorama da resistência a uma classe de antibióticos, chamada carbapenemos, em espécies de Klebsiella presentes em hospitais portugueses. O público-alvo inclui microbiologistas, infecciologistas, epidemiologistas, administradores hospitalares responsáveis por estratégias de prevenção e empresas farmacêuticas envolvidas no desenvolvimento de antibióticos. No contexto da saúde digital, o estudo contribui para a vigilância epidemiológica ao utilizar ferramentas de bioinformática e sequenciação total do genoma para identificar genes de resistência.

Qual é o contexto?
     As infeções associadas aos cuidados de saúde representam uma grave ameaça à saúde pública, sendo adquiridas durante tratamentos médicos ou internamentos hospitalares, resultando frequentemente em hospitalizações prolongadas, custos elevados para os sistemas de saúde e elevadas taxas de mortalidade. Portugal apresenta uma das taxas mais elevadas de infeções associadas aos cuidados de saúde na Europa, agravadas pelo aumento preocupante da resistência a antibióticos de última linha. Estes antibióticos são a última alternativa terapêutica contra infeções por bactérias multirresistentes, utilizados quando outros antibióticos não são eficazes. As bactérias do género Klebsiella são uma das principais causadoras destas infeções, sendo geralmente tratadas com antibióticos da classe dos carbapenemos. No entanto, bactérias produtoras de carbapenemases — enzimas que degradam estes antibióticos — são cada vez mais comuns, tornando o tratamento cada vez menos eficaz.

     Os genes que codificam carbapenemases estão maioritariamente localizados em plasmídeos — pequenas moléculas circulares de ADN independentes do cromossoma bacteriano. Estes plasmídeos desempenham um papel crucial na resistência antimicrobiana, uma vez que podem replicar-se independentemente e transportar múltiplos genes de resistência, permitindo que as bactérias se adaptem rapidamente aos antibióticos. Além disso, facilitam a transferência horizontal de genes, promovendo que a resistência se espalhe entre diferentes ambientes e hospedeiros, incluindo humanos e animais. Um exemplo disso ocorre quando bactérias resistentes a antibióticos estão presentes na carne destinada ao consumo humano. Após a ingestão, essas bactérias podem multiplicar-se no intestino e transferir os seus genes de resistência para bactérias que já lá existem.

Quais são as abordagens atuais?
     Atualmente, a identificação de bactérias resistentes a antibióticos baseia-se numa combinação de técnicas laboratoriais e ferramentas de bioinformática.

     Os métodos laboratoriais tradicionais incluem testes de suscetibilidade, como a técnica de difusão em disco de Kirby-Bauer, na qual um disco impregnado com antibiótico é colocado numa cultura bacteriana. Após a incubação, a presença de uma zona clara ao redor do disco indica suscetibilidade, enquanto a sua ausência sugere resistência. Para uma quantificação mais precisa, o teste Epsilometer (ETEST) determina a concentração mínima inibitória — a menor dose de antibiótico necessária para inibir o crescimento bacteriano — ajudando na escolha da dosagem adequada e na avaliação da resistência a antibióticos de última linha.

     A amplificação por Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) é amplamente utilizada para detetar genes de resistência específicos. Nesta técnica, os investigadores selecionam um gene alvo e desenham primers — sequências curtas de ADN —que definem os pontos onde a amplificação deve começar e terminar. No entanto, a PCR apenas identifica genes previamente conhecidos, limitando a deteção de novas mutações que conferem resistência. Para superar esta limitação, pode ser usada a sequenciação total do genoma que analisa todo o material genético bacteriano, incluindo cromossomas, plasmídeos e outros elementos genéticos. O ADN é fragmentado, sequenciado e, em seguida, reconstruído usando ferramentas de bioinformática, fornecendo informações detalhadas sobre genes de resistência, mutações e variações genéticas que impulsionam a resistência a antibióticos.

     Estas técnicas são ainda complementadas por ferramentas de bioinformática como o BLAST (Basic Local Alignment Search Tool), que compara  sequências genéticas lineares com uma base de dados para identificar genes de resistência conhecidos. O BLAST ring image generator, por outro lado, fornece um mapa circular que compara visualmente um genoma de referência com vários genomas bacterianos ao mesmo tempo, destacando regiões genéticas conservadas e genes de resistência únicos.

Em que consiste a inovação? Como é que é avaliado o impacto deste estudo?
     Este é o primeiro estudo genómico em larga escala de espécies de Klebsiella em hospitais portugueses, que combina análises genéticas, microbiológicas e bioinformáticas avançadas para descobrir mecanismos de resistência aos antibióticos e de transmissão bacteriana. Uma inovação fundamental foi a descoberta de um novo gene de Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC), o gene blaKPC-98, que compromete a eficácia do antibiótico de última linha ceftazidima-avibactam. Apresentado pelo grupo laboratorial, este gene foi reconhecido como uma nova variante no GenBank.

     Para contextualizar as descobertas portuguesas a nível global, o estudo utilizou o GenBank, para identificar genes de carbapenemases e estirpes comuns de Klebsiella a nível mundial.

     O estudo analisou 1.140 amostras clínicas de Klebsiella recolhidas entre 2019 e 2022 em três centros hospitalares portugueses. A multirresistência a antibióticos (resistência a três ou mais classes de antibióticos) foi avaliada pelo método de difusão em disco de Kirby-Bauer contra seis classes de antibióticos. Em seguida, as amostras foram submetidas à análise por PCR e analisadas por BLAST para identificação das estirpes Klebsiella e dos principais genes de carbapenemases (blaKPC, blaOXA-48, blaVIM, blaNDM, blaIMP, blaGES). A partir destas, um conjunto diversificado de 218 amostras foram escolhidas para serem submetidas à sequenciação total do genoma e os plasmídeos obtidos foram alinhados usando o BLAST ring image generator.

     A análise bioinformática incluiu o uso da ferramenta Kleborate para identificar amostras de Klebsiella de alto risco associadas a surtos hospitalares, com base em três fatores genéticos: (1) linhagem de alto risco definida por mutações em genes housekeeping (essenciais para a sobrevivência), que geralmente são conservados, mas que, quando alterados, podem adquirir mutações que marcam novas linhagens e permitem a monitorização da transmissão, pois estas mutações raramente são perdidas; (2) presença de genes de multirresistência e (3) genes específicos K-locus e O-locus, que codificam moléculas à base de açúcares de superfície,  ajudando as bactérias a escapar à deteção pelo sistema imunitário do hospedeiro.

     Para caracterizar o gene blaKPC-98, o estudo integrou análises genómicas, microbiológicas e bioinformáticas, comparando-o com genes blaKPC semelhantes para confirmar sua descoberta. A clonagem genética foi realizada para gerar grandes quantidades de bactérias portadoras de blaKPC-98, sendo depois submetidas a testes de suscetibilidade (Kirby-Bauer e ETEST) para verificar a resistência à ceftazidima-avibactam. Além disso, o estudo também avaliou o custo de fitness, ou seja, o impacto do gene na sobrevivência bacteriana. Para avaliar isso, foi comparado o gene blaKPC-98 com o gene blaKPC-3 através de um ensaio de crescimento bacteriano a longo prazo, cultivando as bactérias durante 240 horas sem antibióticos. O objetivo foi determinar se o novo gene de resistência seria perdido ao longo do tempo devido ao gasto de energia e recursos necessários para produzir a proteína de resistência. No final da experiência, as bactérias portadoras de blaKPC-98 foram novamente testadas utilizando o método de de Kirby-Bauer para avaliar se mantinham a resistência à ceftazidima-avibactam.

Quais são os principais resultados? Quais são as principais conclusões?
     A nível mundial e em Portugal, a Klebsiella pneumoniae é a espécie predominante dentro do género Klebsiella (>93%). Em Portugal, a Klebsiella aerogenes é mais comum do que a Klebsiella quasipneumoniae, enquanto globalmente a tendência se inverte. A distribuição dos genes de carbapenemase varia regionalmente: os genes blaNDM-like dominam na Ásia, blaKPC-3 e blaOXA-48 na Europa e blaKPC-2 na América. Em Portugal, o blaKPC-3 é o mais prevalente, seguido do blaOXA-181 e do blaNDM-1. Apenas 20% das amostras não apresentavam genes de carbapenemase, e várias continham múltiplos genes de carbapenemase, reforçando a preocupação com a disseminação da resistência. Os resultados da PCR e da sequenciação total do genoma foram concordantes, confirmando a robustez da análise.

     A maioria dos plasmídeos produtores de KPC eram grandes, transportavam múltiplos genes de resistência e foram identificados em várias espécies de Klebsiella, sugerindo um mecanismo altamente conservado de transferência horizontal de genes. Da mesma forma, plasmídeos produtores de OXA-181 também foram detetados em diferentes espécies de Klebsiella, demonstrando o potencial de disseminação destes elementos genéticos.

     Todas as amostras com o gene blaNDM-1 possuíam o mesmo plasmídeo (pNDM1_FMUL424), pertenciam à mesma estirpe de Klebsiella pneumoniae (ST11-KL105-O2) e eram originárias do mesmo hospital (Hospital 3), confirmando um surto hospitalar com possível transmissão entre pacientes. Em contraste, o Hospital 1 apresentou outras linhagens dominantes de Klebsiella pneumoniae: ST17-KL25-O5, ST147-KL64-O2, ST13-KL3-O1, ST13-KL19-O1 e ST307-KL102-O2, enquanto o Hospital 2 foi afetado principalmente por ST17-KL25-O5 e ST13-KL3-O1. As linhagens ST17-KL25-O5 e ST147-KL64-O2 estão globalmente difundidas desde meados da década de 1980, enquanto as estirpes ST13 parecem ser exclusivas dos hospitais portugueses. Um surto alemão foi associado ao ST307-KL102-O2, destacando o seu potencial de disseminação internacional.

     O estudo constatou que 98,9% das amostras eram multirresistentes, apresentando elevadas taxas de resistência a penicilinas (99,1%), carbapenemos (90%-97,4%) e cefalosporinas (85,2%-96,5%). No entanto, a ceftazidima-avibactam manteve-se eficaz na maioria dos casos, com uma taxa de resistência relativamente baixa de 8,6%. Este perfil de resistência reforça a urgência da monitorização contínua de mecanismos de resistência emergentes, como o recém-descoberto gene blaKPC-98, identificado na linhagem ST13-KL19-O1 de Klebsiella pneumoniae. Este gene foi comprovadamente capaz de comprometer a eficácia da ceftazidima-avibactam. No entanto, o gene blaKPC-98 impôs um elevado custo de fitness, levando à sua perda após 240 horas sem exposição ao antibiótico. Em contraste, o gene blaKPC-3 com um menor custo de fitness, permaneceu presente. A tendência das bactérias de perderem plasmídeos não essenciais ao longo de gerações permite-lhes otimizar a sua sobrevivência, mas sob pressão antibiótica sustentada, os plasmídeos portadores de múltiplos genes de resistência proliferam de forma mais eficiente, impulsionando a resistência antimicrobiana nos hospitais.

     Para combater a Klebsiella resistente a carbapenemos em ambiente hospitalar, é essencial uma vigilância epidemiológica reforçada, adotar medidas rigorosas de controlo de infeções e promover a colaboração internacional através da partilha de dados e boas práticas. Os programas de gestão de antibióticos devem promover o uso responsável de antibióticos, reduzindo a pressão seletiva e preservando as opções terapêuticas de última linha. Pesquisas futuras devem incluir a análise de amostras ambientais, como superfícies hospitalares e fontes de água, para mapear vias de transmissão e compreender melhor os mecanismos de resistência.

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